quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Construindo um Caiaque de Madeira - Parte 4 - Final

      A última etapa da construção do Cupim e do Taraquá durou cerca de 3 semanas e envolveu uma série de pequenas e médias tarefas, tais como:

a) Aplicação de uma fina camada final de cola epóxi ao casco, ao deck e ao anel do cockpit
b) Fixação do assento do banco no casco
c) Confecção e instalação do apoio lombar (backrest) do banco
d) Colagem do anel do cockpit no deck
e) Fixação dos apoios de quadril (hip braces) na parede interna lateral do cockpit
f) Derramar cola epóxi nos bicos dianteiro e traseiro do barco (mantido na vertical)
g) Serrar e lixar os bicos dianteiro e traseiro (e adaptando este para receber posteriormente o leme)
h) Confecção e instalação do leme (no caso do Taraquá)
i) Lixação final de todo o barco
j) Pintura (Taraquá) ou aplicação de verniz (Cupim)
k) Ajuste de tensão dos cordeis de controle do leme
l) Instalação das linhas-de-vida e do sistema de fechamento das tampas dos hatches
m) Perfuração do bico dianteiro para instalação de alças para se carregar ou puxar o barco (lifting toggles)

      Além dessas, fizemos muitas outras pequenas tarefas que, se citadas, tornariam enorme a lista. 

Taraquá pintado

Colando o anel do cockpit

Satisfação


      Os assentos de banco foram adquiridos dos EUA via internet, assim como os apoios dos pés (foot braces) do Cupim. O Taraquá, por dispor de leme, possui em vez de foot braces um sistema de controle de leme por barra transversal feito com madeira, cola epóxi, parafusos e pino de aço, de baixo custo, portanto, embora um pouco pesado (1,4 kg). A estrutura de alumínio do leme me havia sido gentilmente presenteada pelo amigo co-construtor, Leonardo Esch, tendo pertencido a um caiaque argentino de sua propriedade. Tive apenas de substituir a lâmina do leme, que era de fibra de vidro, muito pesada e espessa, e estava quebrada. Com a ajuda de um torneiro mecânico, uma nova lâmina de leme foi confeccionada a partir de uma placa de Nylon Tecnil de 8 mm de espessura. Trata-se de um material consideravelmente leve, bastante resistente às ações do sol e do sal, e extremamente resistente a forças exercidas lateralmente ao leme, situação responsável pela maioria das quebras de leme. Embora um tanto caro, vale à pena o investimento, e eu recomendo fortemente a quem queira substituir por conta própria uma lâmina de leme partida. É muito melhor do que fibra de vidro, aço ou alumínio, materiais costumeiramente usados para isso.

      A vedação das tampas dos hatches foi feita pela aplicação de silicone. Mais tarde, quando os barcos foram testados no Guaíba, isso se mostrou inadequado e o sistema de vedação terá de ser modificado. A pintura com tinta PU automotiva do Taraquá foi feita com pincel de boa qualidade. O ideal teria sido, é claro, aplicar a tinta com pistola, equipamento caro do qual todavia não dispúnhamos. A aplicação da primeira demão de tinta foi feita com muita tranquilidade. Mas a da segunda demão mostrou-se bastante complicada, pois este tipo de tinta é misturada com um catalisador que acelera a secagem, além do que a tinta fresca começa imediatamente a reagir com a tinta seca da primeira demão. Como consequência, a pintura tem de ser feita rapidamente e ao mesmo tempo em que a tinta parece "puxar" o pincel, tornando delicada e cansativa a tarefa. Em todo caso, creio, o resultado final, no caso do Taraquá, pode ser avaliado como aceitável.

        Estávamos já no início de setembro e se aproximava o final da empreitada. Já víamos uma luz no fim do túnel! Marcamos o teste do barco para o dia 10 de setembro, na praia de Ipanema de Porto Alegre. Quase 4 meses haviam transcorrido desde o início da construção, em um já meio remoto dia 14 de maio (ver a primeira postagem dessa série). Levamos os barcos para a praia, abrimos antecipadamente uma garrafa de champanhe (obviamente que não iríamos quebrá-la no casco de um dos caiaques!), fizemos um brinde a nós mesmos, prendemos as saias nos aneis de cockpit e partimos remando. Logo minha ansiedade diminuiu quase a zero, ao perceber, após algumas vigorosas remadas, que o barco navegava com facilidade e mantendo um curso estável. Em seguida o leme foi baixado (mais um mecanismo sobre o qual tinha dúvidas se funcionaria direito) e mostrou-se operante, embora requerendo ainda um ajuste melhor das tensões dos cordeis de controle. Remamos para lá e para cá, tentando capturar o jeitão do barco, sua "personalidade", digamos assim. Após uma meia hora de testes, voltamos para a margem. Pude constatar também que o sistema de recolhimento do leme funcionava muito bem.

Vamo prá praia!

Tá chegando a hora!

Hora da partida

Taraquá

Cupim

Olha a foto!

Namorando ....

Tomando chimarrão


       Nessa empreitada toda, pude contar com a companhia muito agradável e sempre divertida do amigo Leonardo Esch, o construtor do Cupim. Sem sua participação, sinceramente, eu nem sequer teria iniciado a empreitada. Valeu!

      E gostaria também de agradecer a ajuda inestimável do colega Fernando Batista, de Portão, RS, que já está em seu quarto caiaque de madeira construído, por nos ter passado dicas e conselhos de grande valor e ajuda.

      Confira o resumo da empreitada, assim como o teste em água dos barcos, em mais um vídeo rústico da Caboka Jurema: A Construção do Cupim e do Taraquá.

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ALGUNS DADOS E INFORMAÇÕES DE CONSTRUÇÃO DO TARAQUÁ

Comprimento máximo: 5,50 m
Largura máxima: 53,4 cm
Peso final: 29 kg (incluindo a pintura com tinta PU automotiva, leme, sistema de abaixamento e recolhimento do mesmo e barra transversal de controle do leme com os pés).
Custo total em material: aproximadamente R$ 1.500,00. Mas o custo final poderia ter sido menor se algumas economias tivessem sido feitas. Este total, entretanto, não inclui os gastos com a compra das plantas (em torno de R$ 300,00 em novembro de 2012, quando o dólar estava mais "barato"). e tampouco gastos com ferramentas que se fizeram necessárias. O compradoa de uma planta do Bluefin tem direito legal a construir dois caiaques.

domingo, 1 de setembro de 2013

Construindo um Caiaque de Madeira - Parte 3

        A próxima etapa de construção consistiu em cobrir a madeira do barco com tecido de fibra de vidro colado com epóxi, o que confere ao compensado naval muita dureza e bastante resistência à abrasão. Duas camadas de tecido foram aplicadas ao exterior do barco, e uma ao interior. Desta vez, o serviço foi feito no gramado de nossa residência em Ipanema, despertando grande curiosidade dos transeuntes.

Iniciando os trabalhos em um belo dia de sol

Metade do trabalho feito ...

Admirando a obra ao final do dia

      Terminada a etapa de aplicação de tecido de fibra e cola, tratamos de lixar cada o barco externamente por inteiro a fim de eliminar imperfeições e desbastar excessos de cola e de tecido. A lixação produz um pó fino de epóxi seca e fibra de vidro que, além de perigosa para os pulmões, causa uma coceira persistente e incômoda. Usamos, então, máscaras para realizar a tarefa, mas os olhos permaneceram desprotegidos. Ao final de tudo, veio o preço a pagar: as mucosas de meus olhos ficaram muito irritadas e inchadas. Tive de parar de lidar com a epóxi durante alguns dias, e o inchaço lentamente começou a diminuir.

Taraquá todo lixado após a aplicação de tecido de fibra de vidro

Esch serrando espaçadores para construir o anel do cockpit

      Lixação encerrada, serramos o deck em dois locais para produzir as aberturas (hatches) dianteira e traseira dos compartimentos de carga, que são isolados do cockpit por paredes internas (bulkheads) de compensado. Dos pedaços retirados, foram confeccionadas as tampas dos correspondentes hatches. Outros pequenos trabalhos foram feitos em sequência, tais como: furar o deck para a instalação futura de linhas-de-vida; serrar e colar apoios laterias de quadril no cockpit, onde o encosto lombar (backrest) será fixado ao final da construção; serrar uma base para o assento de borracha; aplicação de logotipos etc. No caso do Taraquá, uma tarefa adicional consistiu na instalação do sistema de controle do leme (através de pedal), além do leme propriamente dito. Felizmente o Esch possuía um sistema completo de leme que ele havia retirado de um de seus caiaques argentinos, o qual me foi gentilmente presenteado, economizado-me assim um bocado de trabalho.

Colando as molduras dos hatches

Colando os espaçadores do anel do cockpit entre si  (mas não 
ao deck, do qual estão isolados por plástico, que não cola com epóxi)

Anel do cockpit pronto

Em primeiro plano, o Cupim, cujo deck  acaba de ser colado ao convés

       A próxima grande etapa consistiu em colar o deck ao casco, o que foi feito com fita de fibra de vidro colada com epóxi na parte externa da junção entre as duas partes. O mesmo foi feito por dentro do barco, mas de forma mais limitada, por ser impossível acessar as extremidades do caiaque já fechado. Precisei de 3 dias de trabalho com cola para realizar a tarefa, desta feita usando óculos de proteção para evitar irritar as mucosas dos olhos. Deu certo, mas na etapa seguinte, que consistiu em lixar novamente o barco inteiro por fora (quase 3 horas de lixação), meus olhos ficaram de novo muito irritados e inchados pelo pó produzido. Infelizmente, uma vez iniciado o processo inflamatório, este me acompanharia pelo restante da construção. 

O construtor e sua obra (incompleta)



terça-feira, 23 de julho de 2013

Remada por Costeira de Zimbros

      Havíamos chegado a Bombinhas, SC, no dia anterior, uma sexta-feira ensolarada de julho de 2013. Mas durante a madrugada de sábado choveu bastante e amanheceu nublado. Todavia o vento sul havia cessado quase que por completo, possibilitando na enseada de Zimbros, onde estávamos hospedamos, uma condição de mar adequada para remar em caiaque oceânico. Embora fosse um dia nublado de inverno, decidimos aproveitar a chance para remar, pois as previsões para o fim de semana eram desanimadoras - mais  chuva viria. 

      O destino escolhido foi o costão chamado pelos locais de Costeira de Zimbros, que separa a extensa praia de Zimbros do município vizinho de Tijucas. Incrustadas no costão, existem várias praias semisselvagens, algumas pequenas, outras minúsculas, interessantes para se conhecer em desembarques durante a remada. Aprontamos as tralhas rapidamente após o café da manhã e às 10 da manhã estávamos de partida da frente de nossa pousada (Delmar Residencial), que tem acesso direto à praia. 

Nossa pousada e local de partida - Delmar Residencial

Checando a orientação da câmera GoPro

Preparação do barco

Maria Helena faz um break para contemplar

      Partimos com uma leve garoa que em seguida cessou. Após somente 20 minutos de remada, desembarcamos na Praia da Lagoa. Tiramos fotos e ficamos apreciando a vista da enseada de Zimbros sentados sobre um enorme matacão de granito, com outro ainda maior formando uma pequena toca. Enquanto ali estávamos, o tempo melhorou um pouco, o céu ficou bem menos nublado e chegou a ter um mormaço. Infelizmente nosso sossego, e o dos animais, é claro, foi devidamente perturbado pelo barulho irritante e excessivo produzido por dois motoqueiros-mala, que praticavam seu "esporte" sonicamente imundo percorrendo repetidas vezes a trilha que acompanha o costão. Dois carinhas apenas perturbando quilômetros quadrados de mata virgem ...

Vista norte da Praia da Lagoa

Praia da Lagoa


Vista da praia a partir de nossa 'toca'

Conversa vai, conversa vem .... 

Trieste caminha na 'toca'

Motoqueiros-mala perturbando todo mundo (bichos incluídos)

      Meia hora depois, partíamos. O swell começou a fazer-se notar, com cerca de 60 cm altura, chocando-se periodicamente contra os matacões do costão. Esta parte do costão é especialmente bonita por causa dos jardins de pedra semi-submersos que embolsam a água empurrada pelas ondas acavaladas  sobre lajes submersas, o que dá uma dinâmica toda especial ao local. Passamos pela Praia Vermelha, a mais bonita que vimos durante todo o passeio. Além da bela faixa de areia avermelhada que possui, a praia é cercada por morros e por uma encosta gramada, salpicada de matacões de granito. Não nos animamos a descer por ser uma praia de tombo. O desembarque até que seria fácil, mas o embarque para sair da praia seria bem mais complicado.

Biguás em jardim de pedras

Praia Vermelha à frente

        Nesta parte do costão, notamos que uma faixa de água turva acompanhava o costão. Depois da remada, consultando o Google Earth, concluímos que se tratava de água provinda do Rio Santa Luzia, que deságua no mar bem junto à extremidade sul do costão. Quarenta minutos após termos partida da Praia da Lagoa, desembarcamos numa praia pequena e muito protegida, a Praia da Ponta Grande. Trata-se da penúltima praia do costão, depois dela havendo apenas a Praia de Santa Luzia antes de começar a enseada de Tijucas. Há uma casa de pescadores nesta praia, e vimos muitas redes recolhidas, penduradas nos galhos da amendoeiras ao redor da casa, mas não encontramos ninguém. Fomos recebidos, isto sim, por um simpático e faminto cachorro. Tão faminto que comeu algumas cookies de chocolate conosco. Agora finalmente o sol mostrava um pouco sua cara e o dia estava mais iluminado.

Chegada à Praia da Ponta Grande

Segura o barco!

Vista do canto sul da praia

O cusco nosso amigão

Vista do canto norte da praia. Outro cusco aparece.

Investigação - tem comida aí?

Tomando vinho ao sol

O cusco quer mais cookies!

 
Olha o equilíbrio!

Olha o equilíbrio rapá!

      Depois de quase uma hora na praia, começamos nosso retorno para Zimbros. Ao passarmos pela Praia Vermelha, vimos novamente os motoqueiros-mala, chafurdando na areia molhada do pequeno canal de deságue da lagoinha que existe atrás da areia. Dez minutos depois desembarcávamos na Praia Triste. Em que pese o nome, essa praia nos deu a alegria rara de ver limpeza e extremo bom cuidado geral com a natureza de seus únicos moradores (que não encontramos), residentes de uma casa modesta de madeira nos altos do terreno por trás da faixa de areia. Uma garagem náutica baixa guardava um barco de pesca típico da região. Local ideal para acampar, parte da praia está cercada e com de placas de Proibido Acampar, Propriedade Particular etc. Certamente que aquele trecho da praia não poderia estar cercado como parte de uma propriedade privada, mas, neste caso, demos nosso total apoio moral e silencioso. Não fosse assim, aquilo teria virado local de acampamento, e aí, já viu, né? Ficamos muito admirados com todo aquele cuidado com a natureza, pois a grande maioria dos pescadores costuma descartar  de tudo e um pouco na praia mesmo, desde simples restos de peixes e mariscos que produzem mau cheiro e atraem moscas e mutucas, até partes grandes de equipamento de pesca. A fiscalização da Capitania dos Portos, ou seja lá qual for o órgão público que deveria fiscalizar o uso dessas praias, não costuma cumprir sua missão, de modo que cenas de imundície e depredação são a regra pelo litoral brasileiro. Dessa vez, felizmente, não assistimos ao triste espetáculo da ação da mão podre do homem.

Chegando na Praia Triste

Fica até bonitinho: Trieste na Praia Triste

Limpeza!

Maria Helena toma vinho enquanto atende o celular (!) na praia da Ponta Grande

      Quarenta minutos depois embarcamos. O trecho final da volta levou apenas meia hora. O swell foi progressivamente diminuindo à medida que avançávamos para o interior da enseada, até praticamente desaparecer em frente ao Delmar Residencial. O dia agora estava bem feio, o céu carregado e uma brisa fria e úmida constante. A maré enchente que se fizera notar durante todo o passeio talvez estivesse agora na preamar. Apesar do tempo, muitas pessoas estavam por ali na praia, e o vendedor de mariscos prosseguia seu trabalho com as ondas varrendo as canelas. Levamos as tralhas todas para o chuveiro externo do residencial e as lavamos. Foi só levar tudo pro apê, a chuva desabou com muito vento! E não passou mais. Eta dia bem aproveitado! Confira o vídeo de 4 minutos sobre esta remada.

Remando forte na volta

A rota

Dados da Remada
Distância total percorrida: 13 km
Velocidade média: 6,0 km/h cravados
Tempo total do passeio: 4 horas
Número de desembarques durante o passeio: 3
Consumo de bebidas: uma garrafa de vinho chileno e muita água mineral
Alimentos consumidos: cookies de chocolate